quarta-feira, 11 de julho de 2012

DE PAI PARA FILHO


Olá amigos.

Hoje lhes peço licença para me dirigir, não só a vocês, mas a um amigo em especial.

Olá meu filho

No dia 18 de Julho de 2012, meu filho primogênito, expressão curiosa esta, meu filho mais velho, para ser mais coloquial então, estará após uma longa jornada de seis anos, colando grau no Curso de Medicina, é o Vinícius vai virar doutor, vejam bem, usei o termo doutor em minúscula, de propósito, pois nunca fui muito afeito a estas convenções que nos fazem perder o caminho da simplicidade, e só nos trazem ilusão, orgulho e vaidade. E disto eu sei na primeira pessoa.
Lembro-me com clareza do dia de sua chegada, talvez o que vou dizer aqui  agora, possa escandalizar aqueles que se aterem apenas ao valor  frio das palavras, mas ao contrário da maior parte das pessoas, das quais sinto uma determinada inveja, não posso dizer que tenha sido um dos dias mais felizes da minha vida, me explico antes que me tomem por alguém destituído da mínima sensibilidade, o que não sou, muito ao contrário.
Como a sua chegada não havia sido planejada, deixo aqui de lado as minhas considerações espíritas para não complicar, pois nada acontece por acaso, mas desconsiderando esta verdade, eu não estava minimamente preparado para sua chegada, quer emocionalmente, ou financeiramente falando, não dizendo com isso que ele não fosse aguardado com muito carinho e ansiedade, mas estou falando de um dia específico o dia do seu nascimento.
É muito nítido o quadro na minha memória, adentrei as dependências do HINJA em Volta Redonda com a minha então mulher em trabalho de parto e com o mundo sobre os meus ombros, fazemos nossas escolhas e quando somos defrontados com as conseqüências delas advindas, é normalmente aí , que se instala o pânico.
Pânico, esta é a palavra mais branda para descrever a gama de sentimentos e pensamentos que me atravessavam o ser naquele momento.
Como é que eu podia ser pai?  Que condições eu tinha para orientar, ou como se diz mais comumente, CRIAR um filho?  Como ser um orientador, quando eu próprio era um quebra cabeças totalmente espalhado e com inúmeras peças faltando? Sentia-me inadequado, incapaz.
E a principal pergunta que me martelava o cérebro naquele instante. Como eu arcaria com as despesas do Hospital?  Assim sendo diante de tantas urgentes questões, este instante que era para ser revestido de um significado especial, diria mesmo santificado, se viu contaminado pela premência das questões financeiras e as dúvidas existenciais.
Lembro-me que passadas algumas horas e nada de receber qualquer notícia, o nervosismo foi se instalando e me vi dominado pelos pensamentos de que algo poderia dar errado, e perante a possibilidade de um problema mais sério com a criança, as outras questões emudeceram-se e a tensão instalou-se insidiosamente.
Estava em oração pedindo o amparo de Deus para que tudo pudesse seguir com normalidade, quando sai pela porta o Dr. Vitor Emanuel,  Obstetra e Ginecologista, veio com um sorriso estranho, assim meio de esguelha, falou que o parto tinha terminado e que tinha demorado além do previsto, pois não havia sido possível ser um parto normal como à princípio era vontade da mãe, pois não houve dilatação suficiente, causando desconforto enorme para a parturiente e levando riscos ao nascituro,  outra palavra especial.
Informou-me que tudo havia transcorrido normalmente, com exceção de dois pequenos problemas, agora imaginem minha cara ao receber esta notícia, parto e problemas não são palavras para caminharem juntas em uma mesma sentença sem causar arrepios, mas voltando a cena, me diz ele placidamente, dois pequenos problemas, tomei coragem, tremendo intimamente com o que estava por saber e perguntei: ¬ Que problemas? E acrescentei exibindo uma coragem que estava longe de sentir: ¬ Pode dizer Doutor, eu estou preparado.
Ele me olha e diz da forma mais cínica possível: ¬ Ele nasceu careca e sem dente. Que os panos do pudor caiam sobre esta cena, como diria Mark Twain.
Que enorme alívio e uma vontade maior ainda de matar o Dr. Vitor.
Dr. Vitor Emanuel, nome de rei italiano, médico na acepção da palavra e um ser humano de qualidade, um amigo, um anjo que Deus, naquele momento, havia  enviado em resposta as minhas orações.
Médico das mulheres da família, sempre acessível, cordial, receptivo, humano, qualidades que mais do qualquer outra coisa, quero ver refletidas na conduta profissional e pessoal do meu filho.
Após o susto, aproximo-me timidamente dele e pergunto em uma voz meio trêmula e sumida na garganta: ¬ Dr Vitor, quanto ficou o parto do Vinícius?  Ele me olha meio de lado e fala com o canto da boca: ¬ Vá a merda.  Eu sem entender direito, tornei a fazer a mesma pergunta, e ele vira-se totalmente na minha direção e olha bem dentro dos meus olhos e repete: ¬ Vá a merda, guarde o seu dinheiro para começar a tomar conta do seu filho, vocês são meus amigos, estudei com seu cunhado, seu irmão foi meu aluno na Faculdade de Medicina, não tem cabimento isto, e foi assunto encerrado.
Vergonha, alívio e uma gratidão imensa,  que  faz com que neste momento  meus olhos encham-se de lágrimas  de reconhecimento e meus melhores pensamentos sigam em prece ao amigo, que tanto me ajudou, principalmente com a sua amizade.
Para encurtar o parto, se posso assim dizer, minha mãe, meu Anjo da Guarda em forma de mulher, pagou as outras despesas do Hospital, e assim fui introduzido a paternidade.
Quando me mostraram o Vinícius na maternidade, aquela coisa enrugada, com enorme semelhança com o meu joelho, pensei :  ¬  Oh moleque feio! Quase me mataram quando falei o que achava quando me perguntaram. Anos mais tarde quando conversava com amigos em um jantar e contei esta história, meu amigo, Dr. Jair Nogueira, Cardiologista, falou em tom de libertação: ¬ Cara que alívio, eu também achei a  minha filha muito feia  quando ela nasceu, mas achava que eu era anormal, por isso nunca confessei  nada disto para ninguém.
Como vocês podem imaginar, foi aquela gargalhada geral  e a mulher dele totalmente espantada com a inusitada confissão. Faço idéia do furdunço  mais tarde.
Desculpem-me esta enorme introdução, mas as reminiscências são a razão deste artigo.
Não há receita de bolo, quanto mais em relação a casamento e criação dos filhos, cada um tem sua fórmula, meu casamento foi bem sucedido durante 22 anos, depois tomamos rumos diferentes, mas ainda somos e sempre seremos uma família, quanto aos filhos, posso dizer que sou uma pessoa extremamente afortunada, como o texto é uma espécie de homenagem ao Vinícius, vou ater-me excepcionalmente  a ele hoje.
Vinícius sempre foi um menino especial, ao contrário da minha primeira impressão, que, diga-se de passagem, eu era o único a ter em relação a sua ausência de formosura ao nascer, logo após as primeiras semanas, revelou-se um neném encantador, daqueles de revista mesmo, carequinha com uma penugem loirinha, com um rostinho lindo, que logo a mãe começou a chamar de meu pintinho, ele vai me matar, mas para que servem os pais a não ser para constranger os filhos, e no  caso dos meus pais,  pagar a conta do hospital.
Um menino extremamente carinhoso, de gênio forte, muito corajoso desde bem pequeno, decidido, com um espírito de liderança que chegava a me incomodar em certos momentos, a brincadeira era a que ele determinava, um menino obediente, que nunca me causou um problema mais sério, se não soubesse da seriedade da mãe, faria um exame de DNA, pois não parece meu filho não.
Nunca falou uma mentira mais cabeluda para nós, sempre foi muito transparente, de uma exigência própria enorme a qual tem a péssima mania de cobrar na atitude alheia, sempre competitivo, mas nunca desleal, um ótimo e fiel amigo e namorado, como pode comprovar a Arine, parece que estou a descrever um anjo, o que ele não é,  como pode endossar a Amanda, sua irmã, é simplesmente um ser humano de qualidade, do qual tenho a enorme felicidade de ser pai.
Quando passou no vestibular para Medicina, mais uma vez minha alegria estava obscurecida pela preocupação de como manter um curso tão dispendioso quanto este, mas fomos seguindo até a bandeira de chegada, empurrando o carro às vezes,  torcendo para a gasolina dar em outras, rezando para um pneu não furar, e usando uma expressão que realmente adoro de nossos irmãos evangélicos,. Até aqui nos ajudou o Senhor, ao que acrescentarei, e nunca deixará de nos ajudar,  desde de que nos ponhamos em ação.
A sua ida para Vassouras, não gosto nem de lembrar, chorei uns três dias direto, nem parecia que eu tinha deixado um filho para realizar o seu projeto de vida, parecia mais que eu tinha ido a um funeral, mas isto também já é história, hoje é motivo de riso e gozação na família, mas no dia, não foi nada fácil.
Mas aí está você, com seu curso concluído e as vésperas de colar grau, mais uma etapa realizada, agora é só esperar a festa e a inevitável choradeira..
Não teríamos conseguido esta vitória sem a ajuda de Deus em primeiríssimo lugar, e sem a ajuda de tantas pessoas que seria impossível para eu nominar, mas deixo aqui meu tributo de gratidão a  nossa família, a qual sempre esteve ao nosso lado, incondicionalmente.
Inicia-se para você agora meu filho, um caminho que vislumbro ser de muito trabalho, de grandes realizações e se Deus consentir, de muita felicidade para você, todos os pais querem que seus filhos  sejam BEM SUCEDIDOS, mas qual o real significado desta expressão?   Você porém sabe o que isto quer dizer para este seu pai,  tão cheio ainda de peças faltando no seu quebra cabeça.
O que eu espero de você acima de qualquer coisa, de dinheiro, de posição social, fama ou qualquer outro adereço ilusório que possa ser confundido com SUCESSO, é que você mantenha sempre uma índole dócil, amigável, solidária, que profissionalmente, você possa espelhar-se no exemplo de MÉDICO, agora em maiúsculas, que é o profissional que te trouxe à luz, que você possa ainda guiar-se no exemplo  de conduta profissional que é exemplificada pelo seu tio, profissionais dos quais você se tornará em poucos dias, colega de profissão
Nunca se esqueça que depois da própria vida, a saúde é o bem mais precioso do ser humano, seguido bem de perto da sua, liberdade.
Se eu puder, e eu certamente  posso, farei um único pedido. Nunca se esqueça da sua própria humanidade e o que ela comporta, principalmente a falibilidade. Trate seu semelhante com respeito e afeto, dinheiro é contingência de um trabalho bem feito, e não é o quesito principal para se ter felicidade, a maior tragédia humana é não compreender ainda que a maior felicidade, a felicidade real, está em servir ao próximo, seu pai tem inúmeras falhas, mas tenta arduamente seguir esta diretriz, nem sempre consigo, é verdade, mas é assim mesmo, TENTATIVA E ERRO, até que um dia a gente consegue agir com  ACERTO.
Não se atenha a falsas ilusões de pretensa grandeza escondidas por trás de títulos e investiduras, são apenas adornos para o nosso ego que tem o condão de nos cegar para as realidades da vida, seja um Doutor em simpatia, em humanidade, em caráter, em grandeza da alma, trate todos os que te procurarem com alegria e atenção, dando o melhor de você, não só profissionalmente, mas principalmente como homem, este homem íntegro que você se tornou.
Seja exemplo de profissional, mas seja maior exemplo ainda de um ser humano integral, de formação moral sólida, nunca se esquecendo dos princípios religiosos que tentamos te transmitir, princípios estes que às vezes você contesta,   até mesmo para me irritar de vez em quando, sim, ele é irritante as vezes, mas princípios que nem por isto são menos reais, somos espíritos habitando um corpo, este sim é perecível, portanto nunca se esqueça desta realidade, antes que o corpo apresente os sintomas, os distúrbios se estabelecem na alma, nunca perca isto de vista.
Tenha sempre a mente voltada para o Mais Alto, nunca prescindindo de pedir a proteção Divina, não só para o seu exercício profissional, mas em todos os outros aspectos da sua vida.
Tenho enorme orgulho do homem que você se tornou, apesar das minhas limitações, continue sempre em direção ao bem, seu pai estará sempre ao seu lado, até mesmo para a eventualidade de ter de pagar a conta do parto do seu filho no Hospital, se isto for necessário.  Mas Deus me livre desta tragédia e desta conta.
Lembre-se do açúcar que te falei na viagem  de regresso de  Vassouras para casa, esta sim com um sorriso no rosto.
Torno meus votos e minhas advertências paternais, abrangentes a todos os seus colegas de turma, que eles possam ser muito felizes nesta nova etapa que se inicia, de passo em passo vamos todos percorrendo o trajeto.
Que Deus Nosso Pai de Infinita Bondade e Justiça nos ampare hoje e sempre
Parabéns  Doutor. Vinícius Vieira de Mendonça e Silva
Parabéns meu filho

Ricardo M   
Hoje apenas um pai muito orgulhoso do seu filho..

2 comentários:

  1. Parabéns a Vinícius, meu eterno amiguinho. Torço para que continue gostando de kungfu, como quando era criança (embora para mim e vc ele nunca passe disso). Para Valéria, mãe, e para vc também, amado amigo, sucessos maiores nunca acontecem sem esforços maiores. Este destino é merecido! Felicidades e abraços!

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  2. Parabéns e sucesso ao seu filho! Lindo o seu depoimento!

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