Olá amigos
Desculpem-me a franqueza, mas eu
não gosto do Natal, talvez até soe melhor se eu disser que não gosto da
transformação ocorrida com o Natal, o
fato é que se eu pudesse sair no dia 20 de dezembro e só voltar no dia 5 de
janeiro do outro ano, seria uma dádiva dos céus, de preferência para um lugar
ensolarado, tranqüilo, com uma praia de areias bem brancas, pouca gente ao
redor e um mar de coloração verde azulada, ah, e se não fosse pedir demais, com
águas mornas e ondas amigáveis.
Claro que não conto com os natais
da infância, onde ainda estamos fascinados pela presença do Papai Noel, mas
mesmo nesta época, eu ficava muito triste quando ouvia uma música que começava
assim: Eu pensei que todo mundo fosse
filho de Papai Noel...
Sem saber de uma forma muito
clara, instalava-se já na infância, a percepção da desigualdade aparente que
permeia as coisas ao nosso redor, mas à frente retornarei para explicar porque
usei o termo aparente.
Claro que não sou imune a
transformação estética do mobiliário urbano, aos enfeites natalícios, as
luzinhas multicoloridas que se fazem presentes em diversos lugares, aos
presépios, as cantatas de natal, tudo é muito prazeroso de se ver, as pessoas
tornam-se mais sociáveis e até chego a vislumbrar o que de fato um dia chegaremos
a alcançar, nossa plenitude como seres fraternos.
Contudo, é uma época onde as
diferenças se fazem mais sentidas, um consumismo exacerbado de um lado, e de
outro carências do mais básico para uma sobrevivência digna, não quero que isto
pareça demagogia barata de fim de ano, é simplesmente a constatação das
observações que faço ao longo de muitos anos.
Alguém pode dizer que o Natal tem
uma característica de solidariedade, algumas pessoas, não todas, acordam
minimamente para as necessidades básicas do seu semelhante, mesmo que eu saiba
que já é algo de positivo, me irrita saber que no dia seguinte esta preocupação
com o bem estar alheio, vai estar relegada aos cantos, qual os restos das
fartas ceias, que primam pelo excesso e conseqüente desperdício.
Aplaca-se a consciência, com uma
cesta básica, uma adoção natalina de uma criança carente, uma caixinha de Natal
para os prestadores de serviços básicos, e pronto. Muito júbilo e pouco sentido. Paz na terra aos homens de boa vontade.
Não quero soar muito ácido não,
ainda mais numa época desta, onde tudo parece ser festa, mas vejo famílias que
se digladiam por mesquinharias durante um ano inteiro, reunirem-se nesta época
para se confraternizarem, sem entender o sentido de ser fraterno com, pois este é o sentido da palavra confraternizar.
Outro poderia argumentar que é
melhor se ter um dia de paz do que nenhum, eu concordaria com tal afirmação,
mas detesto hipocrisia, sentam-se à mesa, comem e, sobretudo bebem de forma
excessiva, trocam presentes que serão ridicularizados depois, ou pelo valor do
presente ou pela inadequação do gosto de
quem recebeu ao de quem deu, não vou nem falar de amigo oculto, já escutei cada
barbaridade que é melhor me calar sobre o assunto.
Acabada a troca de presentes,
come-se como se o mundo fosse de fato acabar, bebe-se em quantidades temerárias
e ainda tem a balada depois, até isso já inventaram. Carnatal, Natal Fest, vai vendo aí.
Se perguntar de quem é o suposto
aniversário, sim suposto, até a data foi estabelecida pelo poder religioso
dominante à época, vejam só a ironia, de acordo a uma festividade pagã, adoro
esta palavra, pagã, tudo bem que teria de ser estabelecida uma data ou outra,
mas voltando a vaca fria, se perguntarem de quem é o aniversário, é capaz de
falarem que é do Papai Noel, aquele senhor de barbas brancas, com aquele
vestuário europeu de neve, que entra pela chaminé, caramba me lembrei de um
fato, eu ficava apavorado, lá em casa não tinha chaminé, aí adequaram, ele
entrava pela janela mesmo, e eu como toda criança ficava tentando manter os
olhos abertos para dar um flagra no Papai Noel, vítima de toda excitação,
sempre era vencido pelo sono, e pela manhã o milagre já havia acontecido, ao
menos em meu lar ele sempre compareceu. Sempre fui filho de Papai Noel, para o
meu extremo alívio e tortura de outros tantos, que dele eram órfãos.
Minha aversão, vejo hoje, já vem insidiosamente de longa data, hoje
percebo bem, mesmo na infância me sentia um pouco culpado por receber até o que
não pedia, e meus amigos às vezes nada.
Entendo que nesta época do Natal
a espiritualidade maior atue junto aos indivíduos com mais intensidade, na
tentativa de plantar uma semente em
nossos corações tão individualizados, nossos sentimentos ficam mais aflorados,
nossa sensibilidade fica mais intensificada, eu então que já choro por nada e qualquer coisa, fico intolerável.
Talvez, acabei de pensar isto
agora, minha implicância com o Natal seja principalmente por ele me fazer
perceber o quão pouco faço, sendo tão privilegiado, para minorar todas as
carências que nesta época se fazem mais perceptíveis aos meus olhos.
Quem dera que esta visão
continuasse aclarada pelo restante do ano, os habitantes das marquises, não
estão lá apenas nesta época do ano, nos outros dias, muitos de nós atravessam
para o outro lado da rua, na inútil tentativa de torná-los invisíveis,
inexistentes.
Tenho sim boas lembranças do
Natal, algumas delas espantosas e até bem recentes são inesquecíveis, mas deixa
ficar deste jeito, me lembro claramente dos natais da minha infância, eram
mágicos, ganhar presentes e toda aquela agitação. Quem nesta fase da vida não
gostaria? Já adulto, casado, fui o Papai Noel dos meus filhos, tentando
proporcionar a eles a magia que é tão necessária nesta fase, e que acabamos por
perder depois, ao menos a maior parte de nós.
Agora me digam. Qual foi o seu
maior espanto na infância, ou sua maior
decepção. Eu digo os meus.
Meu maior espanto quando criança
foi saber como eu tinha chegado ao mundo, nas palavras esclarecedoras e inclementes
de um colega mais velho e mais cruel.
Já a minha maior decepção, foi saber que Papai Noel não existia, foi dose
para engolir, quem já passou por isso sabe do que falo, parece que conspiraram
para te fazer de bobo, é claro que não se trata disso, os pais tem a melhor das
intenções, mas minha ojeriza deve ter começado ali, quando me falaram que Papai
Noel, era nada mais nada menos do que o meu próprio pai, até me dói lembrar
disto.
O Natal é de suma importância,
pois marca o início da maioridade espiritual deste planetinha azul, que nos
serve de escola, de hospital e também de cárcere, a história humana passou a
ser demarcada pelo advento da presença de Jesus entre seus irmãos mais
infantilizados espiritualmente.
Antes de Cristo, e depois de
Cristo, este marco divisório faz todo sentido pra mim, pois sua chegada marca o
final de um ciclo e o início de outro para toda humanidade terrestre, para me
utilizar de um termo mais atual, Jesus veio dar aquele Up Grade na civilização
humana, veio para trazer uma revolução nos costumes e na forma de nos
relacionarmos com o Criador e principalmente na forma de nos relacionarmos uns
com os outros, de se ver no outro um irmão.
Onde o homem por ignorância havia
criado a figura antropomórfica de Deus, dando Lhe uma feição humana, mas uma
vez desvirtuando o sentido das palavras, somos sim, criados a imagem e
semelhança Dele, não Ele a nossa semelhança, coisas da nossa, ainda presente, infantilidade espiritual, mas
já temos um caminho percorrido.
Onde havia um Deus, raivoso,
genioso, vingativo, parcial, ou seja,
muito humano, trouxe-nos a figura de um Pai, assim Jesus O denominava,
Pai, e que como um verdadeiro Pai, entendia a limitação momentânea de seus
filhos em processo de aprendizado e amadurecimento.
A vinda deste irmão maior, mais
experiente, infinitamente mais sábio,
nos deu a oportunidade de uma maior compreensão, de descobrirmos o poder
de uma palavrinha curta, em quase todas as línguas, simples, mas de difícil e
complexo entendimento, execução e vivência,
qual seja,a palavra AMOR.
Ao longo deste trajeto da nossa
história, após o advento Crístico, a humanidade vem aos tropeços ao longo dos
dois últimos milênios, tentando por em prática a simplicidade de seus
ensinamentos, e como tudo que é simples e verdadeiro, temos enorme dificuldade
em interiorizar. Engatinhamos ainda na prática da caridade, da simplicidade e
acima de tudo da fraternidade. Somos irmãos, todos nós, ou quase todos, temos
uma noção minimamente básica desta realidade, temos uma só origem e um só
destino.
Contudo em uma sala de aula,
existem os que se esforçam para aprender a lição, assim como os que não prestam
a mínima atenção no professor, ou pior ainda, aqueles que tentam atrapalhar as
aulas, assim se processa o nosso aprendizado, uns um pouco à frente e outros
mais atrasados, os que vão à frente um dia conscientizam-se dos que estão à
retaguarda e aprendem a felicidade de amparar os que necessitam de ajuda.
Por isso falei que as
desigualdades são aparentes, são apenas
o resultado prático, visível, de nosso
esforço de aprendizado, somos o resultado de nossas escolhas, assim como quem não dá a devida importância ao
professor repete de ano, fica de dependência ou recuperação, na escola
universal processa-se o mesmo, portanto
o que se vê muitas vezes como uma incompreensiva injustiça dos céus, trata-se
apenas de um processo de aprendizado, onde cada um colhe o fruto do seu
esforço, e é confrontado com o resultado de suas tomadas de decisão, para que
este aprendizado possa se processar, de forma contínua e ininterrupta.
Alguns seguem um pouco à frente
outros ainda se arrastam pelo caminho, mas a ajuda nunca está muito longe,
porém nada vem sem mérito, é necessário o esforço consciente de melhoria do
indivíduo.
Gostaria muito que eu pudesse me
lembrar no dia 25 de dezembro, da importância real desta data, que hoje se
encontra soterrada pela avalanche de consumo em que foi o Natal transformado.
Um stress louco, gente gastando o
que não pode, levada por uma consciência
de culpa, como se algo material fosse suprir as carências da alma, ah,
esquecendo que logo depois da farra, vem as matrículas do colégio, IPTU, IPVA e
tantas outras letrinhas que nosso honrado governo nos impõe, por isso o nome
IMPOSTO, aliás, mais certo do que a morte só os impostos.
Que este ensaio anual de
solidariedade, que acontece no mês de dezembro, encontre eco durante o restante do ano, que
esta euforia seja transformada em ação produtiva, no sentido de minorar as
carências de nossos colegas de turma, que os que estejam um pouco à frente,
tornem-se o amparo de quem vem mais atrás. A vida não é uma corrida de São
Silvestre, quem chega em primeiro lugar ressente-se da solidão da chegada, e
entende finalmente a necessidade de
retomar o caminho e reerguer os que se encontram em dificuldade de caminhar.
Sem demagogias, desta noção de
Natal, eu sou partidário, faz mais sentido com a importância da qual se reveste
o aniversariante, que de nós apenas requer atenção a aula e respeito, nunca
temor, ao professor, lição mais simples de se entender não existe.
Amar a Deus sobre todas as
coisas, e ao seu próximo como a você mesmo.
Não fazer ao outro, o que não
quiser que o outro te faça.
Simples não? No entanto mais de dois milênios se passaram e
não conseguimos agir segundo o que nos foi ensinado com tanta simplicidade.
Meu sincero desejo neste Natal, é
que possamos ser alunos mais aplicados, mais atentos aos deveres de casa, mais
respeitosos com o professor, quem sabe assim agindo, não nos qualifiquemos ao
menos para sermos monitores de classe.
Um grande abraço à todos, com
meus sinceros votos de um Feliz Natal
Feliz aniversário para você,
irmão maior.
Que Deus nosso pai de infinita
bondade, nos ampare a todos hoje e sempre.
Ricardo M